Aulas

Filmar por contra própria

“Maio, 1973

Eu compro uma câmera. Quero começar a filmar por contra própria e para mim mesmo. O cinema profissional já não me atrai mais. Para buscar algo diferente, quero me aproximar do cotidiano. Sobretudo, o anonimato. Leva um tempo para aprender a fazer isso. […] a partir de agora, devo escolher entre tomar a sopa ou filmar a sopa.”

David perlov

Diários são relatos construídos entre o tempo cronológico – inscrito nos dias, meses e anos – e o tempo subjetivo, que se esparrama pelas expectativas, incertezas e rememorações, no ir e vir das lembranças e inquietações narradas. É também nesse registro que David Perlov filmou por anos pedaços da própria vida: as vistas das janelas, os interiores domésticos, a esposa e as filhas, as esquinas e pontos de ônibus da cidade, o trabalho e as frustrações com o cinema. Mas o documentário “Diário (1973-1983)” é também feito de imagens revisitadas. Os fragmentos foram montados e narrados por Perlov algum tempo depois de terem sido produzidos, resultando numa narração ritmada e reflexiva, atenta e observadora, que faz também do filme um diário audiovisual reinventado. “Diário (1973-1983)” é marcado pela inventividade da memória e do ensaio, borrando as fronteiras entre filme doméstico e cinema, ficção e documentário, numa obra singular, como foi também a trajetória desse instigante cineasta. 

Filme: Diário, 1973-1983. Direção: David Perlov. Israel, Inglaterra: 1973-1983, 330 min.
Onde assistir? Alguns trechos estão disponíveis no youtube. 
Com direção de David Perlov (1930, Rio de Janeiro, Brasil - 2003, Telavive, Israel). 

FRANÇA, Ana Claudia C. V. de. Filmar por contra própria. Blog Plástico Bolha, 2021. Acesso em: . Disponível em: <https://anafranca.com.br/filmar-por-contra-propria/>.


Publicado por Ana França

Sou professora no Departamento Acadêmico de Desenho Industrial (DADIN) da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), no campo de Narrativas Visuais e Produção da Imagem. No doutorado pesquisei sobre mulheres no circuito de cinema em Curitiba, entre 1976 e 1989 (PPGTE/UTFPR). Dedico-me a projetos em narrativas visuais e investigações sobre mulheres no audiovisual, nos cruzamentos entre história, narrativa, literatura, texto e imagem.