Dois alunos vieram me perguntar sobre como justificar a relevância do projeto de conclusão de curso que começaram. Querem produzir um filme de ficção e humor. Num curso de Design esse tipo de projeto ainda provoca espantos, contrariedades. Naquele momento eu não sei se dei uma boa resposta, sentia calafrios pelo corpo que atrapalhavam meu raciocínio. Logo descobri uma febre. Mas, no dia seguinte, acordei bem. E pensando na relevância da ficção. Num curso de Design.
Queria, então, dizer pra eles que imaginar talvez seja importante. Uma faca de tomate, uma capa de chuva, um projeto de sinalização tiveram que ser primeiro imaginados. Sem imaginação não existe sequer pesquisa acadêmica. É preciso estudar, recombinar e inventar possibilidades para os fragmentos de textos e de imagens que nos acompanham. A ficção corre por toda parte.
A imaginação se movimenta também pelas memórias, pelas imagens, pelos desejos, pelos sonhos. Walter Benjamin escreveu que quem pede um conselho pede, na verdade, ajuda para continuar uma história. Pede ajuda para imaginar o futuro, vejam só. Aconselhar é uma prática narrativa. Ficção, invenção e imaginação nos salvam de diferentes maneiras, entre facas de tomate e jeitos de continuar a vida.
Um filme de ficção e humor num curso de Design serve, então, para a prática da imaginação. Para projetar uma visão de mundo, para pensar as coisas e os usos das coisas pela linguagem. Serve para contar uma história, ficcionalizar o cotidiano, construir imagem e som.
Neste mundo cheio de vídeos curtos, viciantes, mentirosos e corrosivos, o audiovisual é como a fotografia, uma linguagem incontornável. E, como designers, devemos conhecê-la e, talvez, manipulá-la. Jogar com ela. Se possível, contar boas histórias. Ao menos, saber das suas possibilidades. Ampliar a nossa experiência como espectadoras. Se não há controvérsia sobre projetos de fotografia num curso de Design, não deveria haver também sobre projetos audiovisuais.
Por fim, estudantes de Design da UTFPR, em geral, produzem bons filmes. Passaram por aulas excelentes de Teoria da Cor, Composição, História da Arte, História do Design, Fotografia, Semiótica, Representação, Ilustração, Design e Cultura, Cenografia, Animação, Quadrinhos, Escrita Criativa. Com tudo isso um filme se relaciona.
Se oferecemos a disciplina de Audiovisual é porque acreditamos que este campo é importante para a formação acadêmica de designers. Há benefícios para a profissão nessa aproximação. O trabalho de conclusão de curso é uma etapa única, mas é também só mais uma etapa da graduação. Pode abrir caminhos novos, pode servir à curiosidade. Pode reinventar o que se conheceu durante o curso, pode repetir ou expandir projetos iniciados no segundo ou no quinto período. Pode se misturar com outras histórias, vividas bem longe da universidade. Ainda bem.
Não sou maluca de afirmar que Audiovisual é Design ou Design é Audiovisual. São campos muito distintos que, vez ou outra, dançam juntos. E o mundo é cheio dessas danças. Acredito que, fazendo filmes num curso de Design, somos amadores. Diletantes do cinema. E é muito especial, num mundo utilitarista, uma relação de projeto que se estabelece pela curiosidade, pelo encanto, pelo desejo de experimentar. Às vezes, até pelo amor. Que o nosso curso permita desvios formativos – extrapolações do Design – é das coisas que considero mais especiais.
Para citar esse artigo como fonte de sua pesquisa utilize o modelo abaixo:
FRANÇA, Ana Claudia C. V. de. Sobre filmes feitos num curso de Design. Blog Plástico Bolha, 2025. Acesso em: . Disponível em: <https://anafranca.com.br/sobre-filmes-feitos-num-curso-de-design/>.